domingo, 2 de agosto de 2015

Luz


Acho que me apaixonei primeiro pelas mãos. Me lembro vagamente, estávamos todos nós - éramos sempre uns seis ou sete desocupados - deitados no chão. Todos olhavam a TV e eu olhava para ele. Assim adormeci, com a cabeça no colo do meu namorado. Sonhei um sonho de cores vivas. Estava sentada em cima dele, que deitado me agarrava a cintura com as duas mãos. Na minha fantasia tenho o cabelo preso em Maria Chiquinha como a heroína do game, e lhe confesso meu sentimentos. Sorrindo, tento explicar o quanto me enche de tesão quando ele tenta me ensinar algo no violão e abre sobre o braço do instrumento a mão grande e ossuda. Que me derrete ver seus dedos compridos comprimirem freneticamente o controle do videogame. Ele me responde com cócegas, claramente satisfeito com o que ouviu. Com as pontas dos dedos, percorre meu corpo nu, do quadril até a nuca. E eu sinto como se milhares de mãos me tocassem, cada dedo um pequeno impulso elétrico. Imagino-o como uma figura psicodélica de aparência fluida e com vários braços. 

Acordo lentamente dessa soneca, tranquilizada pela impressão de que poderei voltar ao estado de sono em breve, de forma tão natural quanto saí dele. 

Depois de um momento de um vazio mental confuso mas confortável me lembro do sonho e um monte de pensamentos me invadem a mente. Fico um pouco envergonhada com o que esse sonho representa. Uma espécie de evidência dessa atração que sinto por um outro cara. Ele continua a minha frente, vidrado na TV, comentando algo com a magrela ao seu lado. Me pergunto se é realmente sobre ele. Pensaria nele se não estivesse sempre tão próximo? Acho que não. Mas o caso é que ele está. Sempre desconfortavelmente próximo, roubando meu fôlego. E só de pensar me sinto com as pernas meio moles, como se até meus ossos ficassem macios, prontos para o seu toque.